quarta-feira, 19 de dezembro de 2007

sinónimos teus

Sou a rainha do nada,
A duquesa de mão cheia de ausência,
E a plebe com o trapo da abstinência;
Sou o chão frio de azulejos mal pintados,
E a terra quente, seca e infrutífera;
Sou a bela fútil com quem sonhaste,
E o monstro horrendo em quem nem notaste;
Sou o ar molhado de chuva irritante,
E o fogo da tortura que te queima a cada instante;
Sou o cinzento no azul do céu,
E o preto no preto do breu;
Sou o cheiro a podre e a pobre,
E o perfume caríssimo que mal te encobre;
Sou o nada neste mesmo momento,
E tudo do tempo em que sentias comigo,
As ondas ao relento….

domingo, 2 de dezembro de 2007

A razão do serão

Sombras no chão, apelativamente cordiais,
Pretos e brancos, com castanhos sorriais,
Enchi o copo com que brindarás,
Espera, meu querido, sempre chegará.
Seriamente julgas-te senhor,
De todo o conhecimento e amor?
Estar à tua altura é onde não quero ficar,
Não quero estagnar.
Sentes o calor que sobe?
Sentes?
Aprecia o bom vinho que corre agora por ti,
Doce veneno, que com todo o gosto te servi
Sente, tal o ardor que me causavas no olhar,
Sente agora o amargo sabor da solidão,
Eterna, serena, sente-a porque corre por ti.
Sempre correu, só a quis intensificar
Cai, não te vou dar a mão,
Não me agarres, não supliques,
Não tenho dó de ti, espalha-te pelo chão,
Frio, impessoal e misterioso como tu.
Merecem-se.
Chora baixinho, insulta-me, grita.
Daqui a momentos, meu querido, ela chegará.
E tudo acabará.
Com sincero gosto meu.
Depois, vou sentar-me no teu cadeirão,
Vou esperar por ouvir o ultimo suspirar,
Vou beber do mesmo bom vinho,
E vou descansar. Voar. Respirar.

quinta-feira, 29 de novembro de 2007

Naranjo en flor

Era mas blanda que el agua,
que el agua blanda,
era mas fresca que el rio,
naranjo en floor...

Y en esa calle de estio,
calle perdida,
dejo un pedazo de vida
y se marcho...

Primero hay que saber sufrir,
despues amar, despues partir
y al fin andar sin pensamiento...
Perfume de naranjo en flor,
promesas vanas de un amor
que se escaparon en el viento...

Despues, que importa el despues?
Toda mi vida es el ayer
que me detiene en el pasado,
eterna y vieja juventud
que me ha dejado acobardado
como un pajaro sin luz.

Que le habran hecho mis manos?
Que le habran hecho
para dejarme en el pecho
tanto dolor?

Dolor de vieja arboleda,
cancion de esquina
con un pedazo de vida,
naranjo en flor...

segunda-feira, 26 de novembro de 2007

O poeta

Sentada num mero banco do jardim olho para o nada e tudo. Nada se passa nesta cidade mais agitada que a agitação. Sinto-me ligeira e completamente perdida nesta cidade morta de vida. Tudo se move num turbilhão sem sentido. Ninguém sabe para onde vai mas continua caminhando. Sobre esta rua sem fim sonho com ele mesmo. A vida é uma longa espera pela pessoa encarregue da nossa felicidade, e ninguém me ensinou a esperar. Aprende-se tudo, como comer, como estudar, como trabalhar, como criar mas a viver é outro assunto. Seria tudo tão mais fácil se…Não sei o fim desta pequena frase que me surge sempre no pensamento. Caminham todos como se soubessem o que estão a fazer, vidas sempre atarefadas com o destino do segundo, mas o longo prazo nunca é garantido. Sempre a duvida. A lacuna do ser que atormenta. A minha maneira de ser pelo menos assombra. Nunca sei o que estou a fazer mal, e continuo-o a faze-lo sem aprender. Ninguém me ensinou a viver ou a esperar. Ninguém me ensinou a pensar e faço-o sem querer. A cabeça do avesso mesmo quando estou de pé, não sei quem me fez isto, quem é o culpado astral deste desastre. Doce quimera que me arranjaram e me amarga a cada minuto que passa. Um dissolver de pensamentos sem nunca os querer pensar. Alguém que me ajude a focar. Olho sempre no vago e não vejo, penso. E seria feliz se não o fizesse. Nada estaria errado, era louca e no meu mundo tudo bateria certo. Não gosto de me esforçar para perceber os outros. Suponho que cada um no seu mundo, não tem defeitos não tem problemas não pensa. Tenho que pensar no julgamento alheio e penso. Ensinaram-me isso pelo menos, e mais valia que não o tivessem feito. Tento inutilmente mudar a minha maneira de ser, mudar para me adaptar ao meio onde estou inserida. Isso não me deixa feliz, e continua sempre a haver qualquer tipo alheio que julga. Sujeito demoníaco que me preocupa sempre no momento em que me deito. Mancha os meus lençóis brancos do nada. E penso sempre, mesmo quando durmo. E odeio. Seria vulgar e sobrevalorizado dizer que desejo deixar de pensar. Não sei o que quero, e não quero ser julgada por isso. Nunca soube nada, tenho a noção disso. Sou desinteressante. Sou fria. Não adorável, não amável. Sou má pessoa. Sou egoísta e egocêntrica. Julguem, pelo menos na folha de um papel tudo não passa de um mero desabafo que realmente não tem significado, ou de uma mera fantasia inventada pelo escritor do momento. Se pensar bem, nem sempre isso é verdade. O poeta nem sempre é assim tão fingidor, nem sempre finge a dor que deveras sente. Penso. E se não o fizesse, não vivia. E penso, e mesmo assim não sei porque vivo. Mas continuo a viver, porque também não sei porque havia de deixar de o fazer.

segunda-feira, 12 de novembro de 2007

(sem titulo)

És tão engraçado. A vida é tão irónica também sabes. Embora sinta o que sinto nuica te vou dizer. Por orgulho, porque fui burra em cair numa ilusão outra vez. A partir de agora vai ser diferente. Nunca mais. Nunca mais. Estava difícil acreditar nisto, por isso obrigada. Obrigada por me teres feito perder o resto de inocência e fantasia que havia em mim. Obrigada por me fazeres ver o mundo com outros olhos. Obrigada por tudo. É sempre bom, mais uma experiência de vida que nos ensina alguma coisa. Obrigada por seres frontal e ligeiramente louco. Obrigada. Tudo ficou diferente agora. Tudo. Estive a aguentar este tempo todo para me conter, e agora estou livre. E não quero estar. Mas estou, e graças a ti vejo tudo como deve ser visto. Com os pés assentes na terra. E nunca mais dou a ninguém tudo o que te dei da maneira que te dei. Estúpida ignorância a minha.

quarta-feira, 7 de novembro de 2007

15 minutos...

Passam horas. Passam sempre. Passam. E eu despedaço a graça do seu movimento esperando a tua presença que nunca vem. Passam. Sempre passam. Sorrio ao relógio inútil, é um fragmento de mim que não serve para nada. Atrasar-me talvez. Ou preocupar-me, sei lá eu. Passam as horas. Passam. Começo a contar os minutos e os segundos, que passam igualmente inevitavelmente. Passam. A inércia da minha espera que por si só, tira toda a cor da cor que resta do teu ultimo beijo. Da cor, do calor, do desejo. Tudo. Tira-me tudo. Passam os segundos. Conto os segundos também, olhando este estúpido relógio embelezado por mim, na esperança que este por ser mais belo facilite o meu tempo de espera, de vida, de morte. Não facilita nada, era previsível. Passam. E a tua prevista presença não aparece, não chega nunca. E entretanto, os segundos que conto tornam-se mais minutos, e os minutos mais horas. Começa o desespero. Na minha ignorância de saber, o desespero possivelmente nem o é. Será ansiedade talvez, ou vontade de te ver mesmo que seja atrasado. Ou então insanidade, é possível. Comecei há algum tempo atrás, (já nem sei quanto, porque fiquei tão embrenhada nesta confusão de minutos e segundos que não me lembro quanto tempo passou. Decerto passou muito) a reparar no andar das pessoas. É muito mais fácil reconhecer o teu andar, do que estar a fazer olhares incriminadores ás pessoas que vão passando por mim. Decerto pensariam, já mais do que pensam, que sou uma louca maníaca que está à espera de quem nunca vem. Ou então do meu amigo imaginário. Gostava mesmo de saber o que se passa na cabeça de cada uma das pessoas que passou por mim nestes milhentos segundos que estive. Estou a desanimar, nenhum andar familiar. Nenhum olhar familiar sequer. Nada. Sinto já as costas a queimar do olhar da empregada de balcão. Quero sair daqui, e não chegas. Mais segundos e horas embrenhados numa turbilhão de olhares ao relógio de pulso. E ao relógio da parede que está à minha frente. Também é bonito, à sua maneira. Um jeito meio tradicional, a tentar ser moderno. Bonito para quem o comprou provavelmente nos chineses a um décimo do preço. Vês? Já começo a pensar em coisas que não têm lógica. Quer dizer, ter têm, mas não são coisas muito interessantes de se pensar. Mas também o que é que pensa uma pessoa normal quando está a contar os segundos para tu chegares? Se calhar devia ir-me embora, não tenho vontade, claro. Por mim até esperava o resto dos meus dias por ti. Não vou embora. Só daqui a mais uns minutos pronto. Já passaram. Daqui a algum tempo então. Tenho que ter a certeza que não vens para me ir embora. Não a tenho ainda. Espero mais uns segundos, minutos, horas até.
Um andar familiar finalmente do outro lado do vidro, és tu. Finalmente diriges-te à minha mesa.

- Desculpa o atraso.

- Demoraste imenso. Já estava para me ir embora.

- Foram só 15 minutos.

segunda-feira, 8 de outubro de 2007

Hoje, amanhã e depois...

Tenho frio outra vez. Será que está mesmo frio ou é por não estares aqui? Onde estás? Precisava de ti hoje, amanha talvez se o tempo permitisse, e depois, e depois, e sempre depois. Podes ligar-me? Queria tanto falar contigo outra vez. Só hoje, e amanha talvez, e depois. Parece-me que estou a caminhar para um beco sem saída, vazio, e não vou saber o que fazer. Não desta vez. Não outra vez. Por favor, podes vir ter comigo? Precisava tanto de te ver, e aos teus olhos enormes e quase pretos, só hoje, e amanha talvez, e depois. Estou tão confusa, nem sei o que sinto, nem o que vejo, nem o que pode vir a acontecer, só sei que quero estar contigo hoje, e amanha talvez, e depois. E depois? O que acontece depois? Odeio pensar nisto tudo, odeio que isto me tenha consumido o dia todo, e não faz sentido nenhum. Nenhum, eu sei que não. Será que é por estares diferente? Será que é por teres o que não tinhas dantes? Ai não sei, não sei nada. Odeio não saber nada, e pensar sobre o nada o dia todo. E se o nada ficar sempre nada? O que vou fazer hoje? E amanha? E depois?! E se o nada evoluir para um amorfo de atracção com amizade e nada mais? O que vou fazer? Nada? E se evoluir ainda mais, em que situação é que isso me deixa? E será que é isso que quero mesmo? Odeio só saber que já tenho saudades tuas hoje, e vou ter ainda mais amanha, e depois. Odeio ser assim. Será que sou a única neurótica no mundo que pensa que se odeia? Será que mais ninguém ouve a consciência a dizer que se odeia? Será que isso faz de mim menos normal? Não posso ser muito normal de qualquer das maneiras, não se depois de tudo que se passou, ainda estou a pensar no nada. Isto não é nada, pois não? Tenho tanta pena disso. Podes vir buscar-me amanha? Acho que não vens. Vou ver coisas fúteis na televisão e não vou pensar. Não quero pensar mais, estou cansada. Espero que me venhas buscar amanha, mas não te vou dizer. Espero que adivinhes. Amanha e depois.

quarta-feira, 26 de setembro de 2007

vendo bem as coisas...

Espelhos da alma ou não...permitem-me ver a tua perfeição.

segunda-feira, 24 de setembro de 2007

Cheguei...

...À brilhante conclusão que não serves para nada. Nem para me lembrar de ti, até isso me faz mal. Tenho pesadelos e isso é muito chato. És uma grande perda de tempo, diga-se. E tive este tempo todo a pensar em ti. Eu nem sei porque me dou ao trabalho de sequer estar a escrever sobre ti. Ui! e se desaparecesses da minha vida, isso é que era bonito. Cheguei à brilhante conclusão que nem num dia vulgar quero estar contigo, nem por estar calor ou sol, ou noite ou dia, tanto me faz realmente, porque não serves para nada. Basicamente é isso. Nem sei se alguma vez te questionaste sobre o que andavas a fazer da vida. Pois não o deves ter feito, até porque te ias assustar com a resposta: NADA. Ainda quis falar contigo para te explicar porque é que não te queria ver mais, mas no teu dia tão preenchido e atarefado a não fazer nada, não deu. Olha então eu é que não faço mais nada. Livro-me de ti assim, pode ser?! Não me dirijas mais a palavra, não me dirijas mais o olhar. Não quero saber nada de ti, não serves para nada. És um completo fosso ambulante, que cava a minha sepultura. Não quero saber de nada de ti, percebes? Foge de mim se for preciso, muda de rua para não te cruzares comigo, porque se por acidente chocas comigo, eu não sei o que acontecerá. Provavelmente, faço os disparates que sempre quis fazer e só não fiz para não te perder de vez. Mas agora chega. Quero distância. E se alguma vez na vida voltar a sentir mais alguma coisa por ti do que a indiferença que sinto agora, só pode ser pena mesmo, da tua triste pessoa. Afasta-te mesmo, já disse. Não quero pisar sequer o chão imundo que tu pisas, nem estar debaixo do mesmo tecto que tu. As palavras tornam-se completamente ridículas comparadas com a dimensão do nojo que sinto de ti. Que pena, diriam que sempre me fizeste tão bem, que andava sempre tão radiante. Que enjoo que me deu agora. Não te quero ver mais, percebido? E por favor, não me venhas com lamechices e coisinhas queridas, que não resulta. Para tua informação, eu nem sou gelo por dentro para me derreter com as tuas parvoíces, sou pedra mesmo. Vai dar uma curva, e não me apareças mais, nem em sonhos. Nem sei porque tanta gente te quer, sentimento estúpido. Pfff…o Amor! Desaparece-me da frente.

quarta-feira, 5 de setembro de 2007

uffaaa que desafio !!!

Fui desafiada pelo andré do Estado Alpha a fazer o seguinte:

1. Pegar no livro mais próximo.
2. Abri-lo na página 161.
3. Procurar a quinta frase completa.
4. Transcrever a referida frase no blog.
5. Não vale escolher a melhor frase nem o melhor livro (usar obrigatoriamente o mais próximo).
6. Finalmente, passar o desafio a cinco pessoas


Bem eu digo desde já que não costumo achar muita piada a estas correntes mas já que a do Sr. André saiu tão cómica, eu decidi fazer, pode ser que no meu caso me calhe alguma coisa minimamente poética, quiçá.

Então o livro que está mais perto é o “Como água para chocolate” da Laura Esquivel e agora transcrevendo:


“Não vales nada, és uma desavergonhada que não respeita nem a si própria”

E pronto saiu uma frase bastante simpática.
E agora tenho que passar o desafio não é?! Então os pobres coitados serão:

A minha joaninha de Conversa e chá
O Daniel do Unappearence
O Sr. Xinelo do Café do Fausto
A minha irmã do Bledine Lunática
E a Catarina do Neverland…


E pronto tenho dito.

sábado, 1 de setembro de 2007

A Ultima

Meu Querido,

Escrevo-te esta carta como tantas outras que te escrevi durante este ano que passou, lentamente na tua ausência.

Hoje dei comigo a olhar o douro, e a não ver nada, senão água a correr bastante devagar e uns barcos de quando a quando, tão lentos como as águas. Sabes, meu caro, dei comigo a não ver nada mas a pensar em tudo, em ti sim, como sempre.

Sabes sinto-me cansada e basicamente esgotada de passarem sempre as mesmas ideias e recordações pela minha cabeça. Tu como centro, sempre, sempre, e eu a ver tudo de fora. Por muito que me custe dizer-te, e convencer-me a mim mesma também, sim eu sei que não significo nada aos teus olhos, e mesmo assim continuo a escrever-te. Enquanto olhava o nosso rio, meu querido, senti que nunca o fora, nosso pelo menos, seria meu apenas porque só eu lá vou para pensar em ti e como gostava que lá estivesses comigo. Deves estar a achar o tema desta carta estranho, e até me estranhas a mim, mas deixa-me acabar.

Eu sei que nunca te disse nada, eu sei que sempre esclareces-te tudo desde o principio e eu aceitei, meu querido, porque assim podia estar mais perto de ti, conhecer-te mesmo com as tuas duvidas e inseguranças, que como costumas dizer, só me confidencias a mim. Mas hoje, hoje sim, comecei a duvidar da tua sinceridade e dos meus sentimentos por ti. Serei mesmo eu a única que te ouve? E as outras com quem dormes esporádica e apaixonadamente? Podes dizer-me como consigo aguentar isto, assim, sozinha? E como não posso duvidar se isto é amor, ou uma estúpida obsessão pela tua maneira de ser? Não sei, querido, não sei nada. E foi a essa conclusão que cheguei hoje à tarde, quando o sol batia no rio e nas janelas da ribeira.

Lembrei-me daquela noite, em que bebeste demais, e estavas perfeito com os ânimos todos exaltados, e do nada me deste um beijo apaixonado, como se eu não fosse “apenas eu”, e me agarraste ali mesmo na rua. Sabes, que é nisso que penso sempre que passo naquele mesmo sitio, todos os dias a caminho de casa? E alias todos os dias desde esse dia, em todas as ocasiões? Eu penso que sabes. E que também reparaste nos meus olhos, quando no dia seguinte me disseste que não te lembravas de nada, sim querido, estava a chorar por dentro, e por fora queria mostrar-te que para mim também não tinha significado nada. Mas foi a noite mais feliz da minha vida, digo-te agora.

Meu querido, decidi no caminho de volta para casa que tenho de dar um novo rumo à minha vida, deixar de te amar desta maneira e voltar a ter descanso de alma. Por isso vou deixar de te escrever. Não precisas de me responder, não quero que me tentes com a tua adorável simpatia. Não quero que te culpes de nada, porque sei que ainda te amaria mais, se é que isso é possível. Não estou chateada contigo, o amor não me permite, mas preciso de um tempo de ti, consegues perceber-me? Como tantas vezes eu te percebi?!

Por favor cuida-te, e não deixes de te alimentar direito só porque eu não te relembrarei de comer fruta.

É um adeus, meu amor.

Cuidadosamente,

“ Benedita”

terça-feira, 21 de agosto de 2007

Se pelo menos...

Se pelo menos sonhasses comigo…
Se pelo menos vibrasses o mesmo som que eu…
Se pelo menos percebesses o que te digo…
Se pelo menos conhecesses a tua dor…
Se pelo menos respirasses a tua alma com calma…
Se pelo menos olhasses menos sedutor…
Se pelo menos contasses as estrelas para mim…
Se pelo menos andasses lentamente a meu lado…
Se pelo menos conseguisses manter a tua mão na minha…
Se pelo menos soubesses o que sinto…
Se pelo menos fosses mais o que quero…


Se pelo menos morresse esta minha vontade de te ver, meu querido Romeu, meu escuro breu, pobre amor meu.

segunda-feira, 20 de agosto de 2007

Mundo Cão - O Andarilho do desejo

Não foi fascinação, nem paixão
Foi mais um coração sedutor,
Que teve uma explosão de vulcão amador,
Não me vai prender, não me vai conter,
Não me vai pôr fiel, nem a mel,
Não me vai matar, não me vai curar
De comer a maça vilã.

Foi só uma afeição de serão,
Singela depravação de varão solteirão
Não me vai prender, não me vai conter,
Não me vai pôr fiel, nem a mel,
Não me vai matar, não me vai curar
De comer a maça, não

Sou andarilho do desejo
neste reino de consumo e dor
sou andarilho do desejo
numa vida de consumo e dor
sou andarilho do desejo
num destino de consumo e dor

quinta-feira, 9 de agosto de 2007

Noites

Sorrisos dispersos da noite profunda
Que no dia sucumbe
E nos braços meus e teus

Sorrisos repletos de noites futuras
Com imagens puras
Que o nosso olhar reflecte.

Olhos verdes,
Negro sentir da tua perda
Seria a cor escolhida pelos meus

Pele macia, do teu rosto
Que sinto no meu posto
E a lágrima contida
Correu já era dia.

Ávida do sabor dos teus lábios,
Certa que não voltarão aos meus,
Enquanto o dia não for noite.

Contento o meu fervor de ti
Com estes teus fragmentos
Sei que neles és meu,
E eu tua, aqui, como sempre.

segunda-feira, 6 de agosto de 2007

Ridículas

Inércias desesperadas de um tempo que pára quando é necessário que passe. Uma página que não vira mesmo pela violência frustrada da minha mão. Um beijo que roda na cabeça de alguém demasiado cego da estupidez amorosa que o faz deixar de raciocinar com a clareza dos vividos. Uma lembrança marcada nos passos do presente que traça um caminho com falhas e um futuro com quedas. Palavras sem sentido, ditas pelo homem do lado, apenas da boca para fora, cuspidas das suas entranhas, sem sentido como o silencio que o rodeia. Um mundo irreal que roda monotonamente, sempre, sempre, mesmo que tudo nele pareça parado. Tudo na sua normalidade irritante, reconfortante para uns, e extremamente enfadonha para mim. Uma banalidade assustadora que corre pelos meus olhos todos os dias. A não novidade de uma vida vivida á espera de algo que não acontece. Algo que não sustenta o ar que respiro, mas que dá a esperança errada suficiente para continuar a acreditar. Farta de saber que ela acaba antes da morte, e viver uma vida sem cor é possível mesmo para o mais estúpido apaixonado. Filmes e poemas de amores impossíveis, e novidades diárias, e descobertas brilhantes e um mundo de hipóteses, que não existe. Tudo é falso. Restam-me pelo menos algumas certezas de amor amigável de alguns, e as incertezas dos que se aproximam, e pouco mais, que podem sustentar a minha ilusão durante mais uns tempos. A incerteza ainda se apodera de mim, mas serei felizmente acordada desta inércia ridícula, amanha, quando o sol raiar no horizonte, e o mundo rodar na sua rotina, saberei que afinal tudo não passou de um momento que passou muito lentamente, mas não parou. Afinal tudo se movimenta, lentamente, felizmente.

quarta-feira, 18 de julho de 2007

Dialectos

Amor: Começo por me apresentar, não que seja necessário porque nenhum sentimento será mais famoso que eu. Mesmo que não me conheçam pessoalmente, tenho a certeza que já ouviram falar de mim. Sim sou eu o amor. Eu sei o que estão a pensar. Sim, eu o selvagem idiota que se lembra de vos ocupar o corpo inteiro quando bem lhe apetece, afinal tem maneiras de boa educação. Sabem, eu apenas sou selvagem no que toca ao meu belo trabalho. De facto mesmo dependendo de um corpo presente para o efectuar, nunca tive horas de entrada ou saída, faço simplesmente o que me parece bem para a altura. Também já se podem considerar com bastante sorte se alguma vez vos preenchi com a minha extraordinária presença por uns breves segundos. Tenho tanto que fazer, e tantas pessoas para visitar que sinceramente nem sei porque se queixam tanto se pelo menos uma vez na vida me sentem verdadeiramente. Eu sei que deixo sequelas, e por isso uma vez que vos tenha visitado, algo de bom permanecerá em vos para o resto da vida. Deixo-vos sempre fragmentos microscópicos de mim para vos aquecer a alma eternamente, por isso ando sempre tão exausto. Sim, e ainda me atiram insultos e esse tipo de aberrações por me terem tão pouco. Sabem se eu deixasse mais de mim sempre que visito alguma pessoa, já não havia amor no mundo há muito tempo. É claro que isso já se diz, mas é mentira. Estas notícias de boca em boca, irritam-me bastante. Sabem um sentimento também tem direito ao seu descanso? Tenho que recuperar forças, para continuar no meu esplendor. E este descalabro de depressões que por ai anda? Deixa-me doente. Então um sentimento tão belo como eu visita-os por um pouco, e ainda há problemas depois disso, porque simplesmente não sabem usar a cabeça, e reviver essa altura durante algum tempo pelo menos, e construir uma vida baseada em mim?!

Ódio: Pois claro que não. Então existo eu, claro, para os consumir aos poucos e assim tornar-me cada vez mais viva. Estes humanos completamente desprovidos de controlo, não são capazes de me resistir. Sim, sempre me considerei uma tentação. Todos me querem mesmo sabendo que vos trarei apenas infelicidade. Eu sou aquela que vos chama com um sussurro e vocês nem pensam duas vezes, e seguem-me logo. Claro que no inicio se sentem mais fortes, mais capazes de fazer o que vos apetece sem se sentirem presos a ninguém, mas eu sou mais esperta que vocês, seus palermas. Depois destes anos todos ainda não perceberam a minha jogada? Eu traio a vossa confiança num piscar de olhos, e quando vocês menos esperam nessa vossa sede de mim, eu tiro-vos tudo o que têm, e ficam sem nada, um vazio que vos ocupa, e eu completamente repleta de mim, e com mais forças para continuar. Mesmo assim continuam a procurar o meu apoio. Enfim, eu sou o sentimento mais feroz, mais esperto, até consigo fazer-vos deixar de pensar correctamente, apenas para me sentirem por completo. Sim, eu sei que esse amor que por ai anda, a dizer que é o maior, e essas chachadas de que tanto se gaba, também vos tira um pouco da razão, mas eu sei que sou melhor. Até mesmo, porque quando ele voz deixa, burros como vocês são, não percebem que podem ficar com a luz dele por dentro na mesma, e então chego eu, ilumino-vos ainda mais, preencho-vos com linhas de fogo invisíveis que vos cegam, e logo de seguida mergulho-vos na escuridão. E é ai que vocês erram. Eu fico com o que ele deixou em vos, e vocês sem nada. É que podia ser uma questão de sorte, mas não, posso repetir estes golpes vezes sem conta, que sou sempre bem sucedida.

Razão: estarei correcta se ignorar o que foi antes dito? Sentimentos completamente abstractos são a fonte de todos os males. Seja amor, ódio ou qualquer outro que se possa sentir, mesmo que na sua prepotência de acharem que não sou necessária, sou apenas porque se não existisse não saberiam o que estão a sentir. Como actuariam sob influência do ódio, se eu não existisse, para vos fazer os planos, para vos traçar as metas, para vos fazer sobreviver na escuridão? E o amor? Mesmo que me deixe levar no seu encanto, porque sempre me cativou pessoalmente, como saberiam que o sentem sem eu vos dizer? Como saberiam que eu fraquejo na sua presença se eu desaparecesse por completo? Como saberiam que fico baralhada quando apenas sentem, se não vos avisasse?! Nem o mais tolo dos tolos, está livre de mim. Sem sentimentos, não posso viver claro, pois não teria muito que racionalizar, não saberia o que é o bem ou o mal de acordo com os seus efeitos, e não poderia alertar. Necessito deles para me formar, para ter noção dos acontecimentos que me causam alegria ou tristeza, que trazem saúde ou doença, mas quando estou formada, posso imita-los na perfeição, apenas com a minha força de vontade. Posso fazer-vos acreditar que sentem, quando apenas pensam que sentem. Essa é a minha grande vantagem sobre eles. Eles ocupam-vos durante um curto período de tempo, apenas para se darem a conhecer, e depois sou apenas eu que vos controlo. Sou tudo o que têm a maior parte da vida, sou eu que vos prendo a alguém ou a varias pessoas, sou eu faço recordar dos efeitos que o amor teve, e que o ódio pode ter. Sou eu que vos recordo dos momentos felizes e infelizes que viveram. Sem mim que seriam? Não seriam porque não sentiriam, e apenas o vazio seria o vosso companheiro de viagem.

terça-feira, 17 de julho de 2007

Alberto Caeiro

"Passei toda a noite, sem dormir, vendo, sem espaço, a figura dela,
E vendo-a sempre de maneiras diferentes do que a encontro a ela.
Faço pensamentos com a recordação do que ela é quando me fala,
E em cada pensamento ela varia de acordo com a sua semelhança.
Amar é pensar.
E eu quase que me esqueço de sentir só de pensar nela.
Não sei bem o que quero, mesmo dela, e eu não penso senão nela.
Tenho uma grande distração animada.
Quando desejo encontrá-la
Quase que prefiro não a encontrar,
Para não ter que a deixar depois.
Não sei bem o que quero, nem quero saber o que quero.
Quero só Pensar nela.
Não peço nada a ninguém, nem a ela, senão pensar."

Apesar de não ser um poema meu como se pode ver, é dos meus poemas favoritos e descobri-o há relativamente pouco tempo. Acho que o é porque descreve bem o sinto quando esses sentimentos me preenchem. Obrigada Daniel por o teres dedicado a mim nesta altura da tua vida.

Acordar

Acordei a pensar em ti. No teu cheiro. Nas tuas mãos. No teu sorriso. Nos teus olhos. No teu olhar. No teu antigo olhar. Será que estas noites nunca vão acabar? Estas noites que me deito a pensar em ti. Estas noites que sonho contigo, com o teu olhar, com o teu tocar, com o teu cheiro. Acordo e parece que ainda te sinto sobre a minha almofada e na minha cama, onde te deitaste tantas vezes. E eu ali contigo.
Acordo e sinto as lágrimas que já não choro levarem-me a ti. Como queria acordar outra vez como acordava. Sentir os teus olhos em mim. E olhar para ti e saber que não poderia estar em qualquer outro lugar senão a teu lado. Dói. Dói e não deixa de doer. Saber que apenas eu sinto tanto a tua falta. Que nada vai voltar atrás e não posso seguir o caminho mais fácil. Voltar para ti. E tu voltares para mim. Poder olhar-te, poder tocar-te, poder sentir a tua pele e todos os teus pequeninos defeitos. Continuas dentro de mim como sempre estiveste. Tu, ou aquele que amei. Aquele que amo. Aquela ilusão que me faz agarrar à tua memória e dizer que te quero. Mas o que foste não vai voltar. O que fomos não vai voltar. Continuo a olhar para ti como sempre, mas o teu olhar mudou. Continuo a querer tocar-te como sempre, mas o teu toque já não existe. Continuo a querer falar-te, mas já não respondes como eu esperava. Estás diferente. Quando falas já não dizes tudo o que eu quero ouvir. E tenho medo. Tenho medo de te perder. Tenho medo que te tornes num desconhecido. Tenho, principalmente, medo de nunca mais amar ninguém como te amei. E medo que tu não sintas nada do que estou a sentir.
Tudo parece tão fácil para ti. Eu grito e choro, e tu aceitas. Aceitas e continuas em frente. E eu continuo a acordar com a tua ilusão, e a adormecer com o teu cheiro cravado na minha cama, na minha almofada, em mim. E sonho, sonho que nada se passou, que continuamos inocentemente a amar-nos, a tocar-nos, a sentir.
Acordo, e mais uma vez não te sinto mais. Ficou a ilusão do teu beijo e o teu olhar transparente que me queima. E continuo a querer-te como sempre. As lágrimas caem, e arrependo-me das decisões que tomei. Mas estão tomadas. E um dia vou deixar de chorar. Um dia vou deixar de pensar. Vais deixar de estar dentro de mim. Deixar de estar cravado na minha pele, nos meus olhos, na minha alma, no meu coração.
E vou acordar e não estarás a meu lado.

Chuva

Começou a cair. Lentamente e depois com a força necessária para se fazer sentida.

A chuva.

Gosto de a sentir molhada no meu rosto, nos meus cabelos e nos meus dedos.

A chuva lava a alma. Espero que me lave os pensamentos também. Espero.

Os pensamentos correm como um comboio em movimento. Sou uma passageira e vejo o sol da pequena janela que me sobra para o mundo. Queima-me. Sinto a pele a estalar. É fogo que queima. Agita. Apaixona e aquece demasiado o que deveria permanecer apaziguado. Os pensamentos saltam agora. Este fogo vai fazê-los fugir. Consigo pressentir. Não consigo impedi-los.

Não consigo parar de pensar. Eles não param de correr. Correm, baralhados, rastejam, caem, tropeçam uns nos outros, atrapalham-me. Se chovesse, eles podiam acalmar. Mas não. Não chove e não param de me atormentar. Sempre o mesmo calor. Sempre o mesmo fogo a queimar-me a alma.

Quero pensamentos calmos e preciso de sentimentos resolvidos. Virar paginas e paginas da minha vida já escritas, lidas e relidas, reflectidas, analisadas e pensadas. São os pensamentos agitados que me fazem tomar decisões que não tomaria em tempo de chuva. São os sentimentos reprimidos que afugentam os meus pensamentos e os fazem correr desenfreadamente. Como se de mim própria quisessem fugir.

A chuva que os leve.

A chuva que os lave.

A chuva que os faça parar.

Que me faça parar também.

Se não foi a chuva que lavou a minha alma, foste tu que a levaste quando partiste. Se assim foi, então mata-me mais um pouco. Viver uma meia vida não me chega. Sofro demais. Nunca chegou nada pela metade.

Mata-me um pouco mais. Não te preocupes. A chuva trará nova alma para o meu corpo. E nessa altura, nessa altura sim! Os pensamentos abrandarão. Os pensamentos marcharão lentamente ao sabor da minha vontade. Aprenderam como a chuva a mover-se ao sabor do vento.

A chuva por fim apagou o fogo que me queimava por dentro. A chuva parou os pensamentos fugitivos.

Novamente, sou uma só. Com alma, pensamentos e sentimentos.

Não sou mais passageira no comboio da minha vida. Comando-a. Tenho experiência. Não haverá acidentes, já não tenho pensamentos fugitivos no caminho.

Mataste-me mas eu renasci. E melhor.

Sorriso

A noite já estava escura quando cheguei. Tobias olha-me com aqueles olhos verdes de quem percebe que é mais um dia igual a todos os outros, felizmente para ele. Descalço os sapatos pretos e ponho os pés no chão frio. É o que me sabe melhor de toda a rotina monocórdica da minha agenda. Percorro a casa familiarmente desconhecida como se ninguém la vivesse, apenas a minha sombra, ou o que dela resta à luz da vela acesa no quarto. Achei melhor deitar-me, mas antes tomar um banho quente para não tingir os lençóis com o cheiro do meu corpo, e denunciar naquela casa uma presença viva. Não esta de acordo com as regras, não de acordo com as minhas regras. Ninguém me vem visitar para me preocupar com isso, mas a evidenciar tão nitidamente um corpo numa casa parece-me sempre uma coisa que não quero fazer. Devo gostar dela inabitada de mim, apenas assim me consigo perceber. Seja o banho quente então. Uma chávena de chocolate quente, um cigarro na varanda e leitura de ocasião apenas para não pensar demasiado antes de adormecer. Vou deitar-me finalmente e os lençóis brancos estão frios como sempre. Tobias não chega para os aquecer na minha ausência diária, mas não deixa de ser um bom gato.

Estou a levar algum tempo a adormercer mas finalmente perco a noção normal dos sentidos e o meu peso relaxa sobre o branco. De repente encontro-me num lugar escuro. Estou sozinha no meio de toda a escuridão e tenho medo. Tento tactear a minha cama e a parede do quarto mas não consigo atingi-las. Estou a ver uma luzinha amarela ao fundo, devo ter deixado alguma luz ligada pela casa. Tento levantar-me e sair da cama para a desligar, e pelo menos mergulhar nesta escuridão assustadora mas que me dá prazer no entanto. Sinto que estou em mim no escuro e que me conheço, que consigo falar comigo sem ter de me julgar. Estranho, não consigo sair da cama, parece que não tem fim. Vou até à luz mesmo por cima da cama. Quando lá chego, vejo uma menina estranhamente familiar segurando uma vela. Penso como ela é desagradável à vista, mesmo que os seus caracóis escondam a maior parte do seu rosto. Estou mais preocupada no momento com o facto dela estar dentro do meu apartamento. Falo com ela mas ela ignora-me ou então não me ouve. Grito e começo a desesperar, mas ela nem levanta os olhos para mim.

- “ O que queres de mim? Levar-me á loucura?”

Ela finalmente levanta os olhos e num pequeno instante responde a todas as perguntas. Os seus olhos castanhos brilham à luz da vela, e uma lágrima corre-lhe desajeitadamente pela face.

-“ Quero levar-te à razão. À loucura estás a levar-te a ti mesma.”

Sei quem ela é. Sei quem somos. Somos a mesma mas com idades diferentes. Nada do que estava a viver está a fazer sentido mas tenho esperança que ela, ou eu, me explique.

- “ Logo verás o sentido. Tem paciência. Tens de aprender a ter paciência.”

Parecia saber muita coisa, muito mais que eu. Mas se eu sou ela, ou ela é a minha pessoa noutro corpo, como pode saber coisas que eu não sei?

Começamos a caminhar, e o corredor parece-me estranhamente longo e sombrio. Se calhar no meio de tanta infamiliaridade com a minha própria casa, nunca reparei no seu comprimento. É possível.

Passamos por fotografias da minha infância, da minha família, dos meus antepassados, com amigos, de tempos felizes. Não, não fui eu que pus estas fotos aqui. Tenho a certeza que não estão aqui. Como posso estar a ve-las tão nitidamente? Como foram aqui parar?

-“Fui eu que as coloquei nestes mesmos sítios. Gosto de fotografias. Tu também gostas, apenas não te lembras. Tens de te lembrar.”

Mas eu lembro rapariga. Eu lembro tudo agora sim. Lembro-me como tenho saudades de todos que deixei para trás. Lembro-me sim, como gostava de paralisar um momento com o disparo de uma objectiva. Lembro-me dos tempos de menina, eu era assim. Tu.

Continuamos a andar, e chegamos a uma sala. Neste momento já sei que não estou em casa, estou noutro sitio qualquer, mas esta não pode definitivamente ser a minha casa. Estava completamente clara e eu não gosto de muita luz. Hábitos que se adquirem. Na parede central estava pendurada a fotografia dele. Pensei mas não me atrevi a perguntar. Porque me estavas a fazer isto, rapariga? Jurei nunca mais olhar para isto. Nunca mais olhar para trás.

-“Tens de ter coragem. Eu tenho e tu tens dentro de ti. É a ultima coisa que te peço antes de partir. Tem coragem para resolver os problemas dos quais decidiste fugir. Fugiste de ti também, sabes? E assim deixaste-me também, sozinha no escuro, tendo que te procurar.”

Não respondi. Não consigo olhar os olhos estrelados dela. Sei que o que diz está correcto mas não consigo, sou demasiado fraca para voltar atrás.

-“Adeus, Marília.”

-“Adeus, Princesa.”

Como um raio de sol, a gota salgada no seu rosto brilhou e ofuscou-me.

Acordei. Estava no meu quarto. Tudo dentro do normal, na minha casa desabitada. Ainda era cedo e tinha tempo de fazer, o que mesmo a dormir, já tinha decidido fazer.

Levantei-me. Vesti-me e nem me maquilho, não é preciso, ele sempre me conheceu ao natural. Saio de casa e nem tranco a porta de entrada. Ninguém vai querer ficar com um apartamento morto.

Conduzo até ao local onde sei que o vou encontrar e lá está ele. Depois de tantos anos, continua a ir aos mesmos lugares onde íamos juntos. Olhamo-nos e como sempre o olhar ferveu. Caminhamos em direcção um ao outro e não nos falamos. Os olhos brilham como os de Princesa. Sempre foi isso que gostei nele. Olhamo-nos durante o que pareceu uma eternidade. Ele faz um som de como quem vai falar mas não quero que estrague o momento com palavras e perguntas fúteis, como tem sido a minha vida desde que me afastei deste brilho. Ponho o meu dedo nos seus lábios. Ele não fala mais. Põe a mão na minha anca e beijo-o. Primeiro suavemente e depois com a paixão reprimida durante tanto tempo. Tenho tantas perguntas para fazer, mas faço depois. Tenho que ter paciência.

E passamos a melhor noite desde que nos conhecemos. Sinto que ainda me ama e vejo-o nos seus olhos. Esqueci-me de tanta coisa sobre mim, por fugir dele, mas estou reencontrada. Os nossos corpos pesados caem agora sobre os lençois quentes da cama dele. Somos um só, e vamos continuar assim. Não quero nem posso mais fugir de mim.

Adormeço a pensar no sorriso de Princesa. Como daria uma óptima foto, pequena Marília!

Bullet Proof

Queria ser á prova de bala. Á prova de balas fortes que me atingem o coração quando menos espero. Á prova de abalos, de pequenos parasitas que invadem a minha calma. Á prova do que me consome a alma e me faz ficar murcha como uma flor que foi esquecida. Queria ser tudo o que não sou e nem sei o que quero desejar e amar. Queria saber o que procuro, mas as balas que cada vez mais me atingem a velocidades estrondosas, impedem a minha busca de razão. Estas pequenas balas que ninguém vê, e só eu as sinto. Magoam cada vez mais, uma mais que a anterior e assim perduram numa sucessão de barulhos ensurdecedores, mas silenciosamente dolorosos. Queria ter defesas para estes pequenos sugadores de alma, que me vão deixando mais vazia. Queria saber o que sabem os que já não são inocentes. Queria saber como reagir e mudar o rumo que estou a tomar. Queria ter coragem, muita coragem, como se não tivesse medo de nada nem dessas balas que sempre me rodeiam. Queria, queria, queria. Mas não parece haver maneira de deixar de ser o alvo destas balas simplesmente malditas.

Será que se continuar imóvel, à espera da razão ela chega e torna-me resistente ao sofrimento? Queria saber o que fazer.

Ventos dançantes

Feliz feliz feliz. Sem razão aparente, feliz. Como os que sabem o sentido da sua vida, ou parecem sabê-lo, como os dementes que não conhecem o vazio que nos habita, como uma qualquer pessoa que observa uma obra de arte e um rio a correr. Feliz, como se amasse, sem amar. Ou amo, só já não te amo a ti e sim a todas as pessoas que me rodeiam e me fazem sentir calor, a todas as coisas que me é permitido viver, e o douro a correr, e o Tejo também porque não? Sim, feliz como já não me lembro. Feliz só por saber que não estou sozinha, que sou livre como o vento que passa agora pela janela aberta do meu quarto, vento quente e vento frio, tanto faz, sou livre e isso é que importa. Sou livre e amo o que quero e o que me faz sentir bem. Feliz, só isso. Só quero que esta sensação dure para sempre, embora saiba que isso é impossível. Para já vou aproveitar este sentimento de preenchimento e vou dançar como se nunca tivesse dançado antes, sem ninguém a ver, a musica a tocar dentro de mim, apenas sentir o chão aos meus pés e o vento a dançar comigo.

Contigo

Esta a ficar escuro e tenho mesmo que me ir embora, não posso mesmo chegar outro dia atrasada a casa. Estão a acabar-se as ideias para as minhas histórias inventadas rapidamente, para não ser necessário responder a perguntas às quais não faz sentido responder. No caminho vejo o céu em tons de vermelho, céu de verão, e penso como seria bom poder vê-lo assim todos os dias com o mesmo brilho nos olhos que vejo hoje. As pequeninas luzes que me fizeram olhar o espelho da tua alma, logo na primeira vez que nos cruzamos e o mundo pareceu ter parado ali por uns instantes apenas para nos olharmos, estas pequeninas luzes brilham agora nos meus olhos. O dia foi perfeito, apenas perfeito. Andares a meu lado simplesmente sob este céu maravilhoso, mesmo que chovesse e as cores que nos iluminaram hoje já lá não estivessem, bastava acompanhares-me passo a passo para me sentir feliz. E fazes-me feliz apenas com esses pequeninos gestos. Mesmo que nunca te possa tocar, beijar ou confessar o calor estranho que sinto quando te vejo todos os dias, na tua perfeição imaculada de quem não tem uma única preocupação na vida e é livre, com o teu olhar puro e atraente como quem não sabe a impressão que causa á sua volta ou isso não lhe interessa minimamente. És o meu mistério adorado que me prende a esta felicidade alimentada com tão pouco, mas incapaz de morrer.

E fazes-me feliz, já o percebi. Espero que esta sensação nunca mude, porque este ponto de satisfação é demasiado confortável para ser perdido. Assim tudo me parece perfeito, mesmo que não seja.

Parei

Querer tudo e ser resumida a nada. Feita em pó varrido para debaixo de um qualquer tapete. Despedaçada por uma mão fraca e sem jeito para me partir, como se fosse um pedaço de metal frio e impessoal. Como se fosse um fantasma do que fui e sou. Como se não valesse a vida que tenho. Como se nem existisse e os meus actos não significassem nada. Sou livre para fazer o que quero, mas não sei o quero fazer agora que o sou. A indecisão do sentimento e a razão bem definida. Não quero ser correcta nem muito menos educada agora. Quero dizer o que me faz sentir assim. Mandar embora este sentimento hediondo que me afoga o coração em cordas apertadas. Suponho que o que me faz sentir assim não seja a profundidade dos sentimentos mas a superficialidade dos actos. Já estava preparada para isto mas assim não consigo. Não posso dizer que não senti. Senti e tenho pena, pensei que fossem menos profundos do que isto, mas enganei-me. Sinto-me desiludida com o mundo e sem vontade de acreditar nas pessoas. Uma enorme sensação de que tudo se resume á igualdade e á banalidade do desconhecido que passa por mim numa rua clara até a ti que me beijas no escuro. O mundo lá fora continua a correr como se a vida de cada um não importasse. Parece querer privar-me de sentir. Sou resistente eu sei, mas não para sempre. Preciso de descansar e de me abstrair disto tudo que me rodeia. Não posso dizer que me arrependo do que fiz, sei que o fiz porque queria e me fez bem na altura. Mas não repetiria, porque não vale a pena. Não vale a pena sentir para depois ter que esquecer. Não vale a pena tentar para logo a seguir desistir. Nada vale a pena. Só este cigarro que fumo sozinha e os meus pensamentos. Parar. Tudo parou ou pelo menos parece que parou. Apenas ouço um pequeno ruído de fundo que parece ser música enquanto escrevo e tudo no seu devido sitio. Menos eu. Está tudo parado e se calhar é aqui mesmo que devo estar, parada também. Nem este pulso que escreve devia mexer. Vou parar. Vou fundir-me com o silêncio assustador deste lugar e parar. Parar de escrever. De pensar. De sentir. De viver.

Fica

Fica só mais um segundo. Apenas para permanecer sempre comigo o teu cheiro a verão doce. Deixa-o aquecer-me na fria penumbra das noites solitárias.

Fica só mais um minuto. Permite-me o teu olhar e a magia real dele em mim. Olha-me por este fragmento de tempo insignificante, sei que guardarei no meu próprio olhar os teus olhos castanhos, para reconstruir o teu fantasma perfeito depois da hora de partida.

Fica só mais uma hora. Uma pequena hora para te falar dos planos que tinha para nós. Fala comigo também, não quero correr o risco de me esquecer do som da tua voz. Tenho medo de ficar rodeada por apenas um silêncio profundo, para me acompanhar os dias claros e abafados, sem a tua leve brisa com sabor a frescura.

Fica muito mais tempo. Fica porque te peço. Tenho que sentir as tuas mãos rugosas e fortes para me sentir em mim. Preciso dos teus beijos que me fazem render a ti sem qualquer desconfiança.

Penso isto tudo mas quando te observo a descer por essas escadas limito-me a respirar. Olhas-me e caminhas agora na minha direcção. Eu permaneço estática, incapaz de mover um único músculo do meu corpo para te impedir de fazer o que é agora inevitável. Fico assim, presa nos teus olhos e na expectativa dos teus actos. Estás próximo o suficiente para me deixar guardar o teu aroma de fruta e calor. Agarras agora as minhas mãos e sinto tudo mover-se com uma extrema lentidão. As tuas mãos. Ouço-te falar mas pareces-me demasiado longínquo para te perceber. Percebo agora.

- Vou agora, Lídia.

Tudo que te quero dizer passa pela minha cabeça como um relâmpago em céu escuro. Aproximo-me ainda mais de ti e tudo se resume a um sussurro ao teu ouvido.

- Fica comigo só mais uma noite.

Deixa-me estar

Deixa-me estar em mim
E não faças menos do que espero
Tenta perceber que quero
Por em tudo um fim
Pára de olhar, pára de mentir
Os teus olhos já não dizem mais
Que um frio imenso de sentir
E os meus o desprezo dos sinais
Do amor que afinal nunca vivi

Deixa-me, não insistas
Levas-me sempre para o outro lado
Onde tudo é apagado
E só tu mesmo existas
Não suporto nesse lugar
Ouvir o som da tua voz
O cheiro amargo do teu tocar
E o beijo do terror
De estarmos juntos e sós.

Deixa-me, e não deixes nada de ti
Apenas a tua ausência
E as marcas que fizeste
No meu coração agreste
Fica longe, e não me faças repetir
Que o teu ser me enjoa
Se já nem consigo fingir
As palavras que dissemos à toa.
E das lembranças que ficaram
Olhei para elas e sorri
Porque um dia me mataram
E no outro renasci.

Aceno da manha

Tropeço no sorriso que é teu e meu por pensamento.
Sabendo o que consigo em ti e o que necessito sem o teu odor em mim.
Sobes pelo meu sangue onde te encontro todos os dias
No recanto do meu coração e no esplendor da tua alma.

Atento ao teu caminhar por gosto e prazer
E falo o teu falar para ficares em mim cravado.
Cheiro o teu tocar na insignificância de um aceno
Apenas para preservar a sanidade de um louco
Em mim que assim me sinto em ti.

Desce as escadas de mim e pousa onde quiseres
Sei que não sentirei diferença alguma
Pois estando contigo estou apenas comigo
E não sei já viver sem ti.

Fica em mim como se não estivesses onde estás
Dir-te-ia em consciência que noto a tua presença
Digo-te de coração que não sei como me sentiria sem ela.

Mesmo que ocupes só uma pequena parte de mim.
O meu pensamento,
Ele chega para me controlar o dia e a noite,
E tudo o que faço. Pois faço-o a pensar em ti,
No teu cheiro, odor, no teu olhar e no
Breve aceno, que me deste,
Quando passaste por mim esta manha.

o primeiro

Decidi criar este blog para escrever o que sinto, o que penso, o que me apetecer escrever, como é o caso do que estou a escrever agora.
Para quem sabe e conheçe, o outro blog continua la, mas neste vou postar apenas os textos menos pessoais.

para já vou por aqui alguns textos antigos, e depois logo se verá o que vem para estes lados.