Passam horas. Passam sempre. Passam. E eu despedaço a graça do seu movimento esperando a tua presença que nunca vem. Passam. Sempre passam. Sorrio ao relógio inútil, é um fragmento de mim que não serve para nada. Atrasar-me talvez. Ou preocupar-me, sei lá eu. Passam as horas. Passam. Começo a contar os minutos e os segundos, que passam igualmente inevitavelmente. Passam. A inércia da minha espera que por si só, tira toda a cor da cor que resta do teu ultimo beijo. Da cor, do calor, do desejo. Tudo. Tira-me tudo. Passam os segundos. Conto os segundos também, olhando este estúpido relógio embelezado por mim, na esperança que este por ser mais belo facilite o meu tempo de espera, de vida, de morte. Não facilita nada, era previsível. Passam. E a tua prevista presença não aparece, não chega nunca. E entretanto, os segundos que conto tornam-se mais minutos, e os minutos mais horas. Começa o desespero. Na minha ignorância de saber, o desespero possivelmente nem o é. Será ansiedade talvez, ou vontade de te ver mesmo que seja atrasado. Ou então insanidade, é possível. Comecei há algum tempo atrás, (já nem sei quanto, porque fiquei tão embrenhada nesta confusão de minutos e segundos que não me lembro quanto tempo passou. Decerto passou muito) a reparar no andar das pessoas. É muito mais fácil reconhecer o teu andar, do que estar a fazer olhares incriminadores ás pessoas que vão passando por mim. Decerto pensariam, já mais do que pensam, que sou uma louca maníaca que está à espera de quem nunca vem. Ou então do meu amigo imaginário. Gostava mesmo de saber o que se passa na cabeça de cada uma das pessoas que passou por mim nestes milhentos segundos que estive. Estou a desanimar, nenhum andar familiar. Nenhum olhar familiar sequer. Nada. Sinto já as costas a queimar do olhar da empregada de balcão. Quero sair daqui, e não chegas. Mais segundos e horas embrenhados numa turbilhão de olhares ao relógio de pulso. E ao relógio da parede que está à minha frente. Também é bonito, à sua maneira. Um jeito meio tradicional, a tentar ser moderno. Bonito para quem o comprou provavelmente nos chineses a um décimo do preço. Vês? Já começo a pensar em coisas que não têm lógica. Quer dizer, ter têm, mas não são coisas muito interessantes de se pensar. Mas também o que é que pensa uma pessoa normal quando está a contar os segundos para tu chegares? Se calhar devia ir-me embora, não tenho vontade, claro. Por mim até esperava o resto dos meus dias por ti. Não vou embora. Só daqui a mais uns minutos pronto. Já passaram. Daqui a algum tempo então. Tenho que ter a certeza que não vens para me ir embora. Não a tenho ainda. Espero mais uns segundos, minutos, horas até.
Um andar familiar finalmente do outro lado do vidro, és tu. Finalmente diriges-te à minha mesa.
- Desculpa o atraso.
- Demoraste imenso. Já estava para me ir embora.
- Foram só 15 minutos.
Um comentário:
já escreves muitíssimo bem...
Obrigado pelos comentários.
Boa Sorte. :)
André.
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